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Conselho Regional de Psicologia Santa Catarina - 12ª Região



Nota de posicionamento do CRP-12 sobre a escuta especializada e o depoimento especial


Nota de posicionamento do CRP-12 sobre a escuta especializada e o depoimento especial
2018-09-27

O Conselho Regional de Psicologia – 12ª Região é uma autarquia federal de direito público, instituída pela Lei Nº 5.766/71 e regulamentada pelo Decreto Nº 79.822/77, tendo por finalidade orientar, fiscalizar e disciplinar a profissão de psicóloga/o, bem como zelar pela fiel observância dos princípios éticos e contribuir para o desenvolvimento da Psicologia enquanto ciência e profissão.

O Conselho Federal de Psicologia emitiu, em 24/01/2018, a Nota Técnica 1/2018 que versa sobre os impactos da Lei no 13.431/2017 na atuação de psicólogas/os. Considerando que, por meio dessa Nota, o CFP recomenda que, dentre outras questões a serem observadas, essas/es profissionais não realizem inquirição de crianças e adolescentes por meio do depoimento especial, o IX Plenário do Conselho Regional de Psicologia – 12ª Região vêm a público expressar seu posicionamento.

Nessa direção, destaca-se que:

  1. O Código de Ética Profissional do/a Psicólogo/a (Res. CFP 10/2005) estabelece em seus princípios fundamentais que o trabalho de psicólogas/os deve ter como base a garantia de Direitos Humanos. Assim, toda a prática, em qualquer área de atuação, o que inclui a Psicologia Jurídica, precisa ser balizada nesse preceito;
     
  2. Conforme disposto no art. 12 da Lei 13.431/2017 inciso II, o depoimento especial tem por finalidade “a elucidação de fatos”, ou seja, com este procedimento pretende-se a afirmação da ocorrência de fatos, os quais são tratados pelos procedimentos jurídicos;
     
  3. Entendendo-se a subjetividade como o objeto dos saberes/fazeres da Psicologia, a práxis das/os profissionais em todos os espaços de atuação exige processos estruturados e planejados com vistas ao acolhimento, a avaliação, o acompanhamento e o desenvolvimento processual dos fenômenos psicológicos – individuais e relacionais – dialeticamente. Portanto, os relatos de experiências vivenciadas, quando acessados por psicólogas/os, são necessariamente analisados e compreendidos à luz da complexidade de questões culturais, econômicas, politicas e históricas que se constroem continuamente;
     
  4. Os diferentes equipamentos e serviços na área de saúde, assistência social, educação, segurança pública e justiça possuem finalidades específicas a serem cumpridas, as quais devem ser consideradas em conjunto com as prerrogativas que embasam a profissão como, por exemplo, o Código de Ética Profissional do/a Psicólogo/a. Nesse contexto, entende-se que as práticas de cuidado são desenvolvidas numa perspectiva intersetorial, onde diferentes profissionais são convocadas/os a oferecer suas possibilidades de intervenção para que, em conjunto, se possa promover contextos de proteção aos direitos e ao desenvolvimento saudável, principalmente, de crianças, adolescentes e suas famílias. A Psicologia se insere e é parte desse cenário, tendo em vista sua potencialidade de ação. Por outro lado, precisa ter suas especificidades metodológicas e técnicas respeitadas, posto que o trabalho que se propõe a intervir no campo da subjetividade deve levar em conta a complexidade com que os fenômenos psíquicos emergem, são acessados, compreendidos e abordados ao longo do tempo. Em outras palavras, em vez de asseverar a veracidade de um fato, cabe à/ao psicóloga/o compreender as diversas nuances que o envolvem, os múltiplos discursos e pessoas envolvidas, assim como o modo como se produz na história pessoal, familiar e comunitária de cada sujeito, oportunizando formas de cuidado e proteção que correspondam ao objeto dessa ciência e profissão. Ademais, a/o psicóloga/o, neste contexto, é uma/um profissional capaz de contribuir com subsídios (perícia) para que a tomada de decisão sobre a veracidade ou não dos fatos, competente ao Sistema de Justiça, esteja alicerçada em informações fidedignas;
     
  5. No caso específico do trabalho com crianças e adolescentes, compete ressaltar que, por se tratarem de sujeitos em fases iniciais de desenvolvimento, há, ainda, peculiaridades que precisam ser analisadas, tanto no sentido de observar suas condições em termos de ciclo vital para conferir tais informações, quanto a sua possibilidade de compreender as consequências de efetivar relatos nestes contextos;
     
  6. A redução da psicologia à escuta de uma fala literal para fins exclusivos de produção de provas testemunhais desqualifica a potencialidade de ação dessa profissão, precariza o trabalho oferecido por essas/es profissionais e pode, ainda, aviltar direitos à população. Nessa direção, compreende-se que a proteção e promoção de direitos envolve uma reflexão e articulação de diferentes setores que estejam empenhados em acolher a integralidade dos sujeitos e os diversos campos que compõem a sua subjetividade. Práticas que fragmentam e reduzem a criança e o adolescente a um instrumento de acesso a uma verdade sobre um fato, retiram deles/as a oportunidade de contar com uma atuação profissional que respeite a singularidade na direção da cidadania e emancipação dos sujeitos;
     
  7. A Psicologia, enquanto ciência e profissão, é capaz de auxiliar a promoção e a proteção dos direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violências. Contudo, frente às interpretações sobre o fenômeno em tela expressos nos conceitos, na proposição de métodos e atribuições de funções conforme a Lei 13.431/2017, não se encontra lugar para a práxis das/os psicólogas/os, especialmente no tocante ao depoimento especial. Como resposta possível a essa demanda, entende-se que a Psicologia possui instrumentos de intervenção, a exemplo das avaliações psicológicas e dos documentos decorrentes destas. Se a atuação das/os psicólogas/os é chamada a contribuir na produção de provas, quando isto se fizer possível, que estas sejam técnicas;

Diante da complexidade do tema e de seus impactos na sociedade, bem como da necessidade de construir com a categoria caminhos de atuação com base na técnica, ética e crítica, o CRP-12 se posiciona publicamente ratificando a Nota 01/2018 do CFP, somando-se a ela as reflexões acima enumeradas.


Nota 01/2018 do CFP - NOTA TÉCNICA SOBRE OS IMPACTOS DA LEI Nº 13.431/2017 NA ATUAÇÃO DAS PSICÓLOGAS E DOS PSICÓLOGOS:

https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2018/01/NOTA-TECNICA-N%C2%BA-1_2018_GTEC_CG.pdf


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